Nomadismo digital e inovação corporativa: todo mundo pode ganhar
Redação Play • out. 14, 2021

Ninguém mais precisa jogar tudo para o alto – incluindo a carreira e o salário – para explorar o mundo, aprender novas culturas e, claro, oxigenar as ideias. Assim como as empresas, por sua vez, já não dependem de um time 100% alocado para manter sua cultura de inovação rodando. Se pudermos enxergar algum lado positivo na pandemia, sem dúvida será o fato de ter normalizado o trabalho remoto.


Hoje, muitas companhias têm vagas para trabalho integral à distância e milhares de profissionais são contratados sem precisar pisar no escritório uma única vez. Resultado: a pandemia impulsionou a geração de nômades digitais, aqueles sortudos que podem escolher entre morar em Bali, Dublin, Hamburgo ou na Ilha da Madeira sem abandonar o trabalho ou deixar de marcar presença nas reuniões de brainstorming da empresa.


Apenas nos Estados Unidos, segundo estudo do MBO Partners, o número de nômades digitais cresceu 49% em 2020, passando de 7,3 milhões de pessoas em 2019 para 10,9 milhões no ano passado. E, no mundo todo, haverá cerca de 1 bilhão de profissionais nômades até 2035, de acordo com uma estimativa do site Nomad Life.


Entender esse movimento é importante não apenas para se adaptar aos novos tempos, mas para seguir na busca pela inovação em um cenário que parece ter mudado definitivamente.

O perfil dos nômades digitais


Em sua dissertação para o Mestrado de Antropologia da Universidade Nova de Lisboa, a pesquisadora Lígia Gomes avaliou os participantes dos programas da Remote Year, empresa americana que organiza roteiros nômades para trabalhadores remotos, e traçou o perfil desses profissionais: jovens adultos com idades entre 28 e 35 anos, que já trabalham há algum tempo e têm algum poder de compra, mas ainda não constituíram família.


Em reportagem publicada no site do jornal português Publico, ela diz que, em geral, trata-se de profissionais de informática, design, publicidade, tradução, direito e jornalismo, entre outras áreas.


Ou seja, não estamos falando de pessoas que viajam o mundo postando paisagens no Instagram e que fazem dessas postagens o seu ganha pão. Falamos de profissionais que moram fora do seu país de residência permanente e se utilizam da tecnologia para trabalhar remotamente para as mesmas empresas que costumavam trabalhar – ou para prestar serviços para diferentes organizações em regime freelancer. Eles não necessariamente precisam postar sobre onde estão. Não faz diferença, afinal (desde que se adaptem rapidamente aos fusos).


Para a pesquisadora, os nômades digitais querem trabalhar para viver – e não mais viver para trabalhar, como faziam as gerações anteriores. Seu grande ímpeto, ela diz, é introduzir mais felicidade no cotidiano sem descuidar das obrigações profissionais.


Foi exatamente o que motivou o escritor Matheus de Souza a deixar o emprego de assistente de marketing em uma faculdade de Santa Catarina e viajar o mundo trabalhando. “Em 2015 eu tive o mesmo estalo que muita gente teve durante a pandemia: por que ficar 8 horas por dia trancado num escritório se meu trabalho pode ser feito em qualquer lugar com acesso à internet? Quando me dei conta disso, a ideia era fazer home office em Santa Catarina mesmo. Mas aí tive um outro estalo: e se eu, literalmente, trabalhar de qualquer lugar? Foi quando descobri o nomadismo digital”, conta.


Desde 2017, ele esteve em cerca de 20 países, passando não mais de 3 meses em cada um – exceção feita à Tailândia, onde morou por 6 meses. Atualmente vive no México, onde também pretende ficar por cerca de 1 semestre. A experiência inspirou o livro “Nômade digital: um guia para você viver e trabalhar como e onde quiser”, finalista do Prêmio Jabuti em 2020, na categoria “Economia Criativa”.


Matheus não está sozinho nesse desejo por uma vida profissional que fuja do tradicional modelo das 9 às 17h em endereço fixo. Longe disso. A tendência é tão clara que muitos países – entre eles Croácia, Estônia, Alemanha e Islândia, por exemplo – já oferecem vistos específicos para nômades digitais, permitindo que esses profissionais morem nesses locais por um período (geralmente de 1 a 2 anos) enquanto trabalham remotamente para seus países de origem.



Benefícios para a inovação corporativa


A grande questão é: as empresas perdem ou lucram com isso? Como quase tudo na vida, a resposta depende da postura que será adotada. Companhias que resistirem ao fato de seus profissionais poderem ser tão (ou mais) produtivos em qualquer lugar do mundo quanto são entre as paredes do escritório, podem perder seus maiores talentos, irreversivelmente.

Por outro lado, aquelas que tiverem a visão de normalizar o trabalho amplamente remoto podem lucrar em várias frentes. A começar pela óbvia redução de custos com estrutura fixa.


O ganho mais relevante, no entanto, é a possibilidade de manter seus maiores talentos no time, onde quer que eles estejam fisicamente. Outro benefício é usar a contratação de nômades digitais como estratégia para reverter a perda causada pela fuga de cérebros (ou brain drain, no termo original) movimento muito anterior à pandemia, que drena nossos profissionais mais qualificados para escritórios de outros países.


Um estudo da plataforma Workana feito no ano passado com cerca de 2.800 profissionais (entre freelancers, funcionários contratados e líderes) da América Latina mostra que, para 96,7% deles, a opção do home office é um diferencial na hora de escolher um trabalho. E mais de 94% deles dizem que gostariam de permanecer no esquema remoto após a pandemia.


Em relação à produtividade (um dos grandes temores das corporações), quase 82% dos entrevistados avaliam que ela se manteve excelente ou muito boa. Percepção que, aliás, é compartilhada pelo escritor-nômade Matheus. “Só o fato de não perder tempo com reuniões que poderiam ter sido um e-mail já torna meus dias mais produtivos”, afirma. 


E, por fim, mas ainda mais importante, organizações com essa mentalidade aberta podem contar com profissionais que viajam o mundo, aumentam seu repertório e – muito provavelmente – tornam-se ainda mais criativos e inovadores. É uma aposta. Resta saber quantas e quais empresas arriscarão suas fichas.


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